sexta-feira, 10 de junho de 2011

Crianças muito atarefadas perdem melhores momentos da infância

Tratar os pequenos como adultos é um erro cada vez mais comum entre os pais 

O foco nas criança atinge seu auge por volta do século XV. Até a idade média, a infância não era valorizada. Quando desmamada, lá pelos três ou quatro anos de idade, a criança passava a viver no mundo adulto. Não havia escolas formais e a família não era nuclear como agora. Na mesma casa conviviam pessoas de várias procedências.

Na idade moderna, junto com as grandes invenções, a revolução liberal e, mais tarde, com o iluminismo e a formação da burguesia, surge a infância. A criança passa a ser mais cuidada e os laços familiares se fortalecem. Pais e filhos usufruem maior proximidade e a criança passa a ser vista como um indivíduo que precisa de atenção e formação essenciais. A infância passa a se constituir como uma idéia de momento especial, uma idade de ouro. Logo se começava a perceber que valia a pena investir nesse seres tão pequenos e dependentes.  
A infância surge no momento em que se decide deixar as crianças irem à escola, brincarem e serem crianças. Com a modernidade, a infância passa a ser mais estudada e vista como a época de formação. A criança, teoricamente, passa a ser preservada de qualquer exigência de trabalho e a ela é conferido o direito de ser criança, não tendo qualquer outro compromisso senão gozar da plenitude da sua idade.

Liliana Sulzbach (2000) em seu curta-metragem A invenção da infância retrata de uma maneira objetiva e profunda os conceitos de trabalho infantil, comparando as exigências em classes mais pobres e nas classes médias altas. As diferenças são cruciais, mas em ambas acompanhamos uma espécie de corte e de invasão nos territórios do mundo infantil. Crianças assumem funções inapropriadas à sua idade.

Uma criança do interior pobre do nordeste suspira ao dizer: "que jeito tem? Tem que trabalhar...". Enquanto a menina de classe media alta fala com um misto de satisfação e dúvida: "tenho hora para tudo! Tenho vida de adulto, mas é melhor assim!", referindo-se à sua agenda lotada e, por vezes, pouco construída com base no seu desejo ou perfil, tal como o menino que suspira pela falta de alternativa e diz "tem que trabalhar!".  
Almejar para os nossos filhos o melhor dos mundos é perfeitamente compreensível, entretanto o objetivo que subjaz as práticas são questionáveis. Entendemos que a formação atenda às expectativas para que a criança torne-se um adulto ?preparado? para o mundo competitivo, mas para tanto há uma espécie de inversão. Ser criança não necessariamente é ter infância e assim criamos para nossos filhos uma vida que pouco se diferencia daquela levada por nós adultos: horários rígidos, grande quantidade de atividades esportivas, aprendizado de línguas estrangeiras, fonoaudiólogas, psicólogas, pedagogas etc. Uma verdadeira equipe multidisciplinar que poucos adultos têm.  
Papel dos pais
Os pais, a pedido das escolas ou por expectativas próprias, tornam a rotina de seus filhos uma maratona desenfreada de cumprimento de tarefas. O tempo acelera para os pequenos e passa a ser um bem de alto valor para eles.

Na ansiedade de fornecer aos filhos todos os recursos creditados como necessários ao desenvolvimento, os pais correm o risco de subverter os valores em função de ter filhos mais competitivos, mais preparados para enfrentar o futuro.

No meu dia-a-dia, como psicóloga, atendo crianças e converso com seus pais e com aqueles responsáveis pela vida escolar e ouço afirmações como: "meu filho é muito inteligente", "é incrível a capacidade dessa criança captar todas as coisas", "é uma criança brilhante, mas que por algum motivo não vai bem na escola", "meu filho tem uma inteligência acima da média, mas não tem amigos e não se relaciona", "ele é um atleta nato, tem um talento surpreendente" ou, o contrário, "ele é lento para fazer as atividades", "não tem noção do tempo", "não consegue se organizar com as lições", "se distraí com facilidade" e tantas outras afirmações que nos fazem pensar qual o elo dessa cadeia que se perdeu? O que será que tem levado as crianças mais e mais a profundos estados de tristeza, insônia, hiperatividade e déficit de atenção?

Felizmente hoje temos um repertório de conhecimentos vindos da medicina, psicologia, neurociência, que faz toda diferença para conhecermos a etiologia de alguns quadros e poder tratá-los. Fato que há 50 anos era incomum e, portanto, as providências de tratamento eram precárias.  
Assim, não podemos somente atribuir à vida corrida que levamos o aparecimento dos distúrbios da infância. Sem dúvida, os fatores do dia-a-dia como violência, exigências competitivas, acesso fácil aos meios de comunicação, diminuição do tempo de infância, contribuem para aumentar a irrupção de quadros antes mais freqüentes na idade adulta.

O custo de compor uma família também é alto. Preparar os filhos tornou-se um grande e complexo investimento. Pais trabalham incansavelmente para manter seus filhos para assegurar que recursos não lhes faltem. Na outra ponta temos crianças exigidas e cansadas, com pouco aproveitamento do tempo para brincar e aprender na escola. 
O que seria esperado? Não oferecer as possibilidades de aprendizagem? Não, absolutamente. Talvez o elo que precisamos encontrar em nosso dia-a-dia como pais seja o cultivo pelo aprender, pelo estudar e pelo conhecimento. Aprender não é um processo de cumprimento de tarefas, mas sim um processo de descobrir coisas novas, todos os dias, das mais simples às mais complexas. Oferecer os recursos a partir da convicção de que mais do que resultados, esperamos que pais e educadores ajudem nossas crianças a criarem ideais construtivos.

Nem sempre as crianças têm ideia do processo no qual estão envolvidas, quais são as etapas de todo e qualquer aprendizado. Empenho, dedicação, perseverança são valores pouco sublinhados nos processos de aprendizagem. 

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