quinta-feira, 21 de abril de 2011

Parentagem invasiva: superproteção leva a indivíduos frustrados, explica pesquisadora

Pais muito permissivos e ansiosos estão colocando na rua uma geração incapaz de agir por conta própria e se arriscar. Segundo a psicóloga Lucia Willians, pesquisadora do Laboratório de Análise e Prevenção da Violência da Universidade Federal de São Carlos (Laprev/UFSCar) uma das consequências da má parentagem no futuro é o comportamento violento.
Parentagem invasiva: superproteção leva a indivíduos frustrados, explica pesquisadora (umut kemal/sxc)
Você ama seu filho e o cerca de cuidados. Quer que ele, no futuro, freqüente uma boa faculdade e tenha muitas oportunidades na vida. É por isso que hoje ele freqüenta uma boa escola, faz aulas de natação, curso de inglês, futebol, piano e… só tem três anos de idade. Será que isto está certo?
Certo ou não, esta tem sido a tendência da última década. Pais e mães estão excessivamente preocupados com seus filhos e querem que eles sejam felizes e a qualquer custo. Isto inclui estar sempre por perto – até no parquinho! – não permitindo, por exemplo, um tombo, uma briga com um coleguinha, uma frustração ou uma falha. “Neste esforço bem intencionado os pais acabam sendo invasivos, ou seja, acabam se intrometendo mais do que o necessário na vida da criança e do adolescente e se tornam super-protetores. Se é verdade que aprendemos com as experiências, aprendemos a enfrentar problemas com base em nossos desapontamentos, falhas e frustrações. Tais experiências negativas são fundamentais para nos tornarmos um adulto independente e emocionalmente saudável”, explica a psicóloga Lucia Willians, do Laprev/UFSCar.
A parentagem invasiva tem chamado tanto a atenção dos profissionais que em 2008 a jornalista americana Hara Estroff, há 17 anos editora chefe da revista on-line Psychology Today, escreveu um livro sobre o assunto: “A Nation of Wimps: The high cost of invasive parenting” (na tradução livre: Uma nação de covardes: o alto preço da parentagem invasiva). Nele, Hara coleta dados para mostrar o que psicólogos clínicos tem sentido de perto nos consultório: pais medrosos e ansiosos e jovens complacentes, incapazes de assumir riscos, com ataques de pânico, ansiedade e depressão. A autora menciona exemplos nos EUA, mas relata como sua tese encontrou eco na Austrália, Suécia e inclusive no Brasil.
Crianças como troféus
Segundo Lucia Williams, a parentagem invasiva é o resultado de diversos fatores. Pode ser motivada por medo e ansiedade – quando surge a superproteção – por culpa, raiva, emoções negativas. “Imagine um pai ou uma mãe que ligue toda a hora para seu filho, para saber o que ele está fazendo. Isso se chama monitoria estressante”.
Mas não são apenas atitudes exageradas ou abusivas as características deste tipo de parentagem. Na verdade, quando pensamos estar “ajudando” é que podemos estar atrapalhando o desenvolvimento psicológico saudável de nosso filho. No artigo de Hara Estroff, que deu origem ao livro, ela cita exemplos deste comportamento. “Damos aquele “empurrãozinho” para que eles (os filhos) consigam. Na escola. No campo de futebol. (…) Criamos uma estufa que paira sobre eles. Nós limpamos o caminho para que eles passem e limpamos seu rastro. Se eles saem de casa e esquecem um trabalho ou um livro, corremos até a escola para levar. Se eles tiram uma nota baixa, conversamos com o professor para ver se não há “um jeito”. Fazemos a lição de casa para eles. Nosso sentido de vida e status se baseiam no sucesso e conquistas deles, subvertendo suas necessidades de desenvolvimento às nossas necessidades psicológicas. Muitas vezes porque nossa própria vida adulta e nossos relacionamentos estão menos que satisfatórios”. Como explica Hara, as crianças são como pequenos troféus carregados por seus pais para todos os lados.
Mas, afinal, o que está acontecendo com os pais?
Não é o que está acontecendo com os pais, mas com o mundo. Na verdade, a forma como o vêem e interpretam. “Por alguma razão, os pais estão sendo movidos pela ansiedade do mundo atual e acabam por interpretá-lo como sendo um local perigoso e, portanto, precisam proteger o filho a todo custo”, diz Lucia.
E o mundo não é um local perigoso? Segundo a psicóloga, não exatamente. “Pelo contrário, hoje o mundo é mais pacífico que no passado. Temos leis que protegem crianças, mulheres. Basta lembrar que no passado tínhamos escravidão”. O que ocorre é a divulgação em massa da violência. “Vivemos em um mundo em constante mudança, com muita tecnologia nova que nos bombardeia com imagens todo o tempo – muitas destas de violência, o que nos dá a impressão de que o mundo é muito mais perigoso do que ele é na verdade. Isto aumenta a percepção de insegurança”.
Some a isto compromissos, muitos compromissos. “Sentimos culpa pelo excesso de trabalho e pela vida corrida que levamos e queremos compensar isso de qualquer jeito”. Segundo Lucia Williams “paparicar” é uma das formas mais comuns de tentar compensar a ausência e, ao contrário do que se pode pensar, este é um fenômeno que está atingindo pais de todas as classes e esferas sociais. “Fazer um crediário e pagar à perder de vista um presente caro para o filho era uma atitude infreqüente no passado. Entretanto, possivelmente quanto maior o poder aquisitivo maior a chance de cobrir a criança com excesso de objetos materiais e cercá-la de cuidados. Os pais parecem ter se esquecido de que nossa meta seria a de criar pessoas independentes”.
Crise no campus
A principal conseqüência em termos crianças cada vez mais frágeis – menos resistentes às frustrações – que desabam frente à menor contrariedade, é criarmos uma geração de “bonecos frágeis”, de jovens perfeccionistas, sem atitude, que não se arriscam, não suportam a incerteza e o debate argumentativo. Segundo Lucia, a ansiedade está entre outras variáveis associadas a esse fenômeno de baixa resistência à frustração e pouca independência emocional que pode resultar, inclusive, em comportamentos violentos.
“Muitas vezes vemos casos de agressões por parte de adolescentes de classe média que vivem em famílias que os super-protegem, que os acostumam a ter tudo fácil, sem ensinar a lidar com frustrações. Imagino que os pais fiquem também muito frustrados, querendo ser perfeitos em tudo. Pesquisas mostram que pais que ensinam para a criança o que é certo e o que é errado tem filhos menos violentos”, diz.
Segundo Hara Estroff, é na faculdade – fase em que deixam o casulo criado pelos pais – que estes jovens entram em colapso. “O estresse psicológico é tão impactante neste período que toma uma variedade de formas. Consumo excessivo de álcool, abuso de substâncias e automutilação são outras formas de desligamento”. Anorexia e bulimia afligem cerca de 40% das jovens americanas durante esta fase. No artigo de Hara, o então reitor da Universidade de Harvard, Steven Hyman, diz que o estado mental de alguns jovens é tão precário que está começando a interferir no objetivo central da universidade.
E, se considerarmos que as crianças de hoje são o futuro da sociedade, o que esperar? Como sustentar uma economia sem correr riscos inovadores ou ainda como manter um estado democrático sem tolerância para o debate? Afinal, há como conter esta avalanche?
Deixar cair para que aprendam a ter limites
Para Lucia há muita desinformação sobre qual a maneira mais eficaz de ser pai ou mãe atualmente. “Diga-se de passagem esta é a tarefa mais complexa do mundo e da qual existe menos preparo. Cabe lembrar que a pressa é a inimiga da perfeição e ser um bom pai ou uma boa mãe envolve muito tempo”.
Pais aprendem com seus pais a cuidar de seus filhos que, por sua vez, também não tiveram preparo específico – e assim por diante. A dica da psicóloga é buscar informação e uma capacitação contínua. “É preciso ler bons livros sobre parentage e ficar atento a palestras sobre o assunto, onde se possa fazer perguntas e obter respostas para indagações corriqueiras”. Para as situações em que livros não são suficientes, Lucia sugere a busca por ajuda profissional, como um psicólogo ou terapeuta que atue na área.
“Temos de deixá-los brincar e bagunçar tudo. E nós temos que parar de agir como se tudo que a criança faz fosse constar no currículo profissional dela”, cita Hara no final de seu artigo. Para ela, seu livro deveria iniciar uma discussão nacional sobre como estamos educando nossas crianças. “E já estamos atrasados”, conclui.

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