Sem pensar, as pessoas agem com mais generosidade do que se levassem
algum tempo para refletir sobre a lógica de seu comportamento.
Contrariando a crença popular, a conclusão de um estudo recente
sugere que nossos instintos nos levam a ser mais solidários que
egoístas. Isso pode explicar porque os pedidos de doações feitos por
telefone e porta a porta, que exigem respostas imediatas, tendem a
arrecadar doações maiores que as mensagens por e-mail ou correio, que
permitem que as pessoas parem para refletir antes de contribuir.
Da mesma forma, pessoas que realizam atos heróicos – como o homem
que, há cinco anos, saltou na frente de um trem do metrô de Nova York
para salvar um jovem que teve convulsões – muitas vezes tomam decisões
altruístas em questão de segundos.
"Se analisarmos como essas pessoas descrevem suas ações, percebemos
que elas se basearam sobretudo no pensamento intuitivo”, explica David
Rand, cientista comportamental da Universidade de Yale, que conduziu o
novo estudo em Harvard. "As pessoas dizem, 'não pensei, simplesmente
fiz'”.
No best-seller "Thinking, Fast and Slow” (Pensando, Rápido e Devagar), o
Prêmio Nobel de Economia Daniel Kahneman argumentou que a maioria das
decisões ocorre devido à tensão entre dois tipos de processos cerebrais.
De um lado, temos pensamentos rápidos e intuitivos, que costumam ser
emocionais. O outro modo é mais lento, e permite um pensamento mais
controlado e maduro.
Segundo Randy, até agora os pesquisadores tiveram que combinar os dois
tipos de processos de pensamento de uma forma que explicasse como as
pessoas se comportam.
"Imaginamos que as pessoas sejam intuitivamente egoístas, que o
padrão é a sordidez e que só fazemos a coisa certa por meio da força de
vontade e da repressão dos impulsos egoístas”, explica Rand. "Por outro
lado, talvez nossa resposta automática seja a predisposição para a
cooperação, mas em seguida, paramos para pensar e percebemos que o
interesse egoísta vem primeiro".
Para descobrir que hipótese explica melhor como nossa mente funciona,
Rand e seus colegas realizaram uma série de dez experimentos, que
compararam o comportamento de pessoas que tomaram decisões imediatamente
e outras que o fizeram depois de uma pausa.
No primeiro experimento, as pessoas foram divididas em grupos e
receberam 40 centavos. Os participantes podiam escolher quanto gostariam
de contribuir em uma urna comum, um valor que poderia ser dobrado e
dividido igualmente entre quatro pessoas. Ninguém sabia quanto os outros
contribuíram até que as doações fossem concluídas.
Nessa situação, a estratégia mais lucrativa é ser tão egoísta quanto
possível. No entanto, se todos fossem generosos, o grupo como um todo
poderia se beneficiar.
As pessoas que tomaram as decisões mais rápidas sobre quanto doar,
segundo artigo dos pesquisadores na revista Nature, contribuíram com
mais dinheiro para o bem comum. Os que agiram em menos de 10 segundos
doaram cerca de 70% de seu dinheiro, enquanto os que levaram mais tempo
colocaram apenas metade da soma original.
Em experimentos subsequentes, as pessoas que pensaram de forma
intuitiva contribuíram mais que as que optaram por refletir mais. E as
pessoas que foram aleatoriamente designadas para tomar decisões mais
rápidas deram mais dinheiro que as que esperaram dez segundos.
Durante décadas, muitos especialistas presumiram que as pessoas são
natural e automaticamente egoístas, afirmou Simon Gächter, economista
experimental da Universidade de Nottingham no Reino Unido. As novas
descobertas podem oferecer uma visão mais generosa da humanidade.
"A maioria das decisões que tomamos todos os dias são intuitivas, e
muitas pessoas não pensam antes de fazer qualquer coisa”, explica
Gächter. "Aparentemente, nosso instinto é apoiar o comportamento
cooperativo em vez do egoísta. É um dado significativo”.
Apesar da tentação de tirar conclusões sobre a natureza humana, o
estudo não conclui necessariamente que as pessoas são boas e
cooperativas por natureza, destaca Rand. Ele comparou o instinto
automático de ser generoso com o impulso de comer uma caixa de
rosquinhas.
"Se você pensar sobre si mesmo em situações em que tem um primeiro
impulso e depois para para pensar sobre ele, não está claro se o
primeiro impulso se deve ao seu ‘eu’ verdadeiro”, instiga. "Você quer
comer a rosquinha, mas depois pensa, 'Melhor não, rosquinhas não fazem
bem para mim'. Que fala não é o seu verdadeiro eu, é o comedor de
rosquinhas”.
Na verdade, podemos simplesmente aprender e internalizar hábitos
cooperativos que ajudem a sociedade a fluir de forma mais harmoniosa.
De qualquer forma, o estudo reforça o que os arrecadadores de fundos já
sabiam: mostrar a alguém uma foto de um órfão faminto tem mais chances
de mexer com sua sensibilidade intuitiva e emocional. Já listas de fatos
tendem a afastar potenciais doadores.
Para as pessoas que tentam se melhorar a cada dia, a mensagem talvez
seja: é melhor resistir à racionalização e deixar seus sentimentos
falarem mais alto.
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